Acabo de retornar de uma consulta com o fisioterapeuta e não acho que ele esteja muito satisfeito comigo. Hoje foi a nossa segunda consulta e acho que a último também. Há duas semanas atrás foi a primeira vez. Tive um encontro com ele e com um outro fisioterapeuta, que coincidentemente, era um brasileiro. Minha queixa: meu braço se desloca com certa facilidade quando eu faço movimentos bruscos.

A primeira vez foi em meados de 2000: eu desloquei o braço durante uma luta corporal com o meu parceiro na época. Deslocamento é chamado na medicina de luxação. Fui levado às pressas de táxi até o hospital mais próximo em dor angustiante, principalmente sobre as lombadas das estradas. Ao chegar ao hospital tive de aguardar algo como um hora mais ou menos, deitado sobre uma maca, até fazer uma ressonância eletromagnética e ter os resultados em mãos para que os médicos tivessem certeza que nada estava quebrado. O problema é que era 1 hora da madrugada e o enfermeiro encarregado disto estava ocupado com outras coisas. A dor que eu sentia ia dos ombros até o meio da minha coluna. O mais leve movimentar de dedos ou pescoço fazia todo o meu tórax revolver-se de dor. Com o braço relocado, a dor tornou-se imediatamente tolerável. Fui engessado até o pescoço e aconselhado a usar a tipóia por um mês.

Segui as recomendações médicas passo a passo e aos poucos fui conquistando a auto-confiança e recuperando meus movimentos.

Anotações em minha agenda de 2003 que incluem um desenho do motorista sobre o acidente, o qual, após perícia foi comprovado ser uma fraude. O motorista simplesmente cochilou atrás do volante.

No dia 24 de janeiro de 2003,  tive uma luxação no mesmo local num acidente de carro. Eu era guia de turismo e estava empolgado pois havia sido contratado recentemente por uma empresa de turismo. Eu fiz a seguinte anotação em minha agenda de 2003:

“Esta deveria ter sido a programação para hoje mas eu jamais poderia ter previsto que hoje talvez pudesse ser o último dia da minha vida. Uma hora e meia depois de J., motorista novo da empresa x me pegar de carro (uma pick-up) aqui em casa, o carro quase colidiu com um caminhão. J. Consegiu desviar-se, jogando o carro 3 metros abaixo num barranco. Salvamo-nos mas tive luxações sérias bem como um ombro deslocado. J. Teve 7 pontos na nuca e ficou temporariamente imobilizado do pescoço para baixo. O carro capotou várias vezes, ficando finalmente com as rodas para o ar. Recebemos atendimento emergencial na Vitalmed de Sauípe…O acidente foi num local chamado Diogo, a 8 km de Sauípe…A mão com a qual estou escrevendo agora está engessada. O braço direito está na tipóia. Estou tomando analgésicos e anti-inflamatórios.”

A pick-up ficou irreconhecível. Experimentar a sensação de que você poderia ter morrido muda toda a sua vida. E com certeza mudou a minha, pois eu acredito que tudo o que aconteceu em sequëncia depois disto, levando-me a onde estou e quem eu sou, 7 anos mais tarde, está diretamente relacionado a este acidente. Ou seja, para mim, a experiência foi apenas positiva.

Eu de tipóia e minha filha, no mesmo mês do acidente de carro.

Exceto pelo fato de que o mesmo braço sofreu uma segunda luxação e de lá para cá, ele nunca mais foi o mesmo.

Movimentos bruscos como quando por ocasião de um espirro ou como quando se perde o equilíbrio (por exemplo, ao pisar numa casca de banana ou quando a neve vira gelo) são proibidos para mim, pois eu sei que isto é o que eu preciso para deslocar o meu braço. A dor nunca mais foi tão excruciante como em 2000 ou em 2003, mas é suficiente para fazer a minha pressão cair ou deixar-me tonto, mesmo depois que eu consigo reajustar o braço.   

A última vez que aconteceu foi há uns dois meses atrás quando eu estava praticando  patinar inline ou em linha. Este tipo de patinação é uma modalidade do pacote viver melhor que eu incluí na minha vida para o ano de 2010.

Nova paixão: ciclismo

A outra modalidade é ciclismo, esporte pelo qual estou apaixonado. Mas patinar na modalidade inline pode ser arriscado, pode-se, na pior das hipóteses, quebrar o pescoço ou fraturar a região pélvica e ficar incapacitado pelo resto da vida com a perda do controle ao cair para trás.  

Aos 35, quase 36 anos não quero correr mais riscos. Queria um conselho profissional. E por isto fui ao fisioterapeuta do meu bairro. Após muito esticarem o meu braço para cima e para baixo, para direita e para esquerda, perguntando-me “dói?”, eles disseram que eu não tenho nada nos ossos, mas sim nos músculos. Fiquei céptico, afinal de contas frequento a academia a um ano e meio. Eles disseram que o que eu precisava era recuperar a minha auto-estima. Mas não é a perda de auto-estima que causa a dor quando eu faço um movimento brusco, não? Não, eles disseram.

músculos do dorso da escápula

Mas os músculos ao redor do dorso da escápula, entre os quais o músculo supra-espinhal, aparentemente não estão fazendo o dever-de-casa deles direito. Mas que isto pode ser corrigido com fisioterapia. Em todo caso, uma cirurgia definitivamente não é necessário. Marcamos consulta para dali a duas semanas…

…a qual foi hoje. Reafirmei ao fisioterapeuta (o brasileiro não esteve presente desta vez) o meu ceticismo, apesar de que eu respeito a opinião médica e profissioanal dele, mas a dor que eu sinto, é uma dor física real e não algo na minha cabeça, tipo um trauma do passado. Como eu disse, eu considero o episódio dos acidentes algo positivo. Mas agora eu quero praticar meus esportes sem sentir medo. Será que isto é pedir demais? O fisioterapeuta (muito simpático, devo admitir) ao pressentir que o próximo assunto seria eu dizer que iria buscar uma segunda opinião (interessante que isto não existe em holandês, o nome é falado em inglês mesmo: second opinion) disse que não estava aan het bagatelliseren (algo como trivializando) o meu caso mas que este era o melhor julgamento dele. Eu perguntei a ele: meus músculos ficaram flácidos após o acidente? Músculos não são sempre firmes? E com certeza no meu caso, ainda me considerando jovem e praticando esportes?

Eu me desculpei pelo ceticismo. Ele me recomendou uma série de exercícios para o músculo que eu terei de fazer diariamente, pelo menos até semana que vem, quando eu tenho outra consulta com outro fisioterapeuta que vai me indicar demais exercícios. Mas eu continuo céptico.